quinta-feira, 22 de março de 2012

O movimento Precários Inflexíveis (e outros)



Eu tenho tudo para apoiar activamente o movimento Precários Inflexíveis, ou quaisquer outros que, numa lógica semelhante, têm surgido um pouco pela sociedade portuguesa. Fui operador de call-center, fui bolseiro, fui estagiário e sou bolseiro. Ou seja, sou o retrato perfeito de alguém cuja vida laboral se pauta pela ausência de direitos em relação aos demais trabalhadores. Para o exemplificar basta referir que nos 6 meses em que tive desempregado, sem direito a qualquer subsídio, praticamente esgotei os meus recursos financeiros. Isto, porque ao contrário da maioria dos meus amigos, cometi o crime de constituir uma família e, vejam lá, de me reproduzir!

Assim, eu seria o candidato ideal a apoiar as acções deste movimentos e, provavelmente, de me juntar activamente na sua luta. No entanto, se na realidade eu me identifico com o principal motivo da constituição destes movimentos - a precariedade laboral que atinge principalmente os mais jovens e, ao mesmo tempo, contrasta com a rigidez que favorece os mais velhos -, um conjunto de posições secundárias têm feito com que me afaste deles. 

Concretamente posições sobre o aborto, feminismos exacerbados, entre outros. Tratando-se de temas que claramente fazem parte da agenda política dos partidos de esquerda radical, são estes últimos que na realidade controlam estes movimentos.

Como não sou partidário e, inclusivamente, tenho alguma repulsa pela “partidocracia” em que vivemos, não me sinto confortável em colaborar com os Precários Inflexíveis ou outros quaisquer movimentos do mesmo género. Mas é com pena que o digo, pois acho que parte do trabalho que têm feito é louvável, além de extremamente necessário, pois agora mais do que nunca é imperativo lutar pela nossa própria sobrevivência! Sim, porque é mesmo disso que se trata, pelo menos no meu caso, de sobrevivência! 

segunda-feira, 19 de março de 2012

Um roubo chamado EDP

Quando existe um monopólio do lado da oferta, o monopolista é favorecido por uma procura inelástica, isto é, a quantidade adquirida pelos consumidores varia pouco consoante o preço do bem ou serviço que é oferecido. Isto deve-se, por um lado, à necessidade que o consumidor tem em obter aquele bem e, por outro, à difícil substituição deste por outro similar que satisfaça as mesmas necessidades que o consumidor apresenta. É exactamente o que se passa com o sector da energia em Portugal, já que praticamente só existe uma empresa que fornece energia - um bem essencial na sociedade contemporânea para o qual não existe qualquer alternativa - a EDP.

Agindo livremente, o monopolista vende ao preço um mais elevado e, inclusivamente, não lhe convém produzir mais de forma a não baixar o seu preço pelo que assim se compreende, em parte, os elevados custos que a energia tem em Portugal.

No entanto, perante monopólios naturais, como é o caso do sector da energia, o estado costuma deter as respectivas empresas, pois parte-se do princípio que os lucros da empresa monopolista acabam indirectamente por beneficiar a sociedade de uma forma geral.

Agora que a EDP foi privatizada só existem duas soluções para terminar com este roubo: ou se nacionaliza outra vez a EDP, ou se criam condições favoráveis para que outras eléctricas possam operar livremente no mercado português.

Como não me parece que nenhuma vá surgir em breve continuaremos a ser legalmente roubados sine die.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Aplica-se na perfeição aos dias de hoje

Corria o ano de 1868 quando o rei consorte D. Fernando II recebe um (de muitos) desesperado pedido de auxílio financeiro.

O remetente, António Guimarães, tinha sido uma pessoa influente no panorama político português e relata assim o estado da sua desgraça: (o itálico é texto original, os restantes comentários são meus, bem como as citações assinaladas a negrito)

"(…) fructo dos meus esforços foi a perseguição e por fim a miséria.”. Tendo, desta forma, passado os últimos “(…) doze annos (…) em tormentos e aflições mas preferi-os e até os dos meus filhos que me doíam mais do que as minhas, ao sacrifício de convicções baseadas no estudo desapaixonado das cousas do pais.”


Culpando sucessivamente a política, o remetente afirma que “(…) Pelas minhas opiniões a bandeira portuguesa cobriria hoje um vasto comercio de café, açúcar e dos mais géneros coloniais de produção nacional teria, em vez de uma crise financeira.”, no entanto, “(…) Amesquinharam tudo e cuidaram só dos interesses das facções, esquecendo tristemente o que tem d’elevada a missão de governar os estados.. António Guimarães continua advertindo D. Fernando que Adular não é amar os Reis. Aduladores acham elles sempre, amigos leves e dedicados raras vezes.”

Voltando a insistir que “(…)toda essa dedicação cívica, todo esse patriotismo reflectido e desinteressado só me grangearam uma persiguição que conseguiu fazer esgotar os seus recursos de que dispunha e collocar-me na extremidade de suplicar a protecção de Vossa Magestade, porque vão ser penhoradas os meus moveis e consumado o sacrifício do homem pela rasão de querer o bem da pátria.”, o remetente implora um auxílio financeiro já que “(…)Estou afflicto porque sei que os meus moveis vão ser penhorados se não me isempto em 48 horas, d’encargos que contrai e não posso solver porque s’esgotaram os meus recursos particulares e da politica não me é licito fazer uso nem disso sou capaz” e, nas suas próprias palavras, o empréstimo será apenas temporário pois tenciona emigrar para a América onde “(…) em poucos meses m’acharei em condições diversas e de pagar”.

O que me assusta é, por um lado, a actualidade deste discurso, fosse à época válido ou não, e, por outro, o facto de conhecer pessoas que não conseguem (ou não querem) compreender a segunda frase que coloquei a negrito. Isto passados quase 150 anos...dá que pensar!


segunda-feira, 12 de março de 2012

Uma adolescência nos Olivais


Os Verões de 1996 a 1998 foram um período particularmente feliz para mim. Essa felicidade deveu-se, em grande parte, a um local - os Olivais - e a um conjunto de pessoas. No início da adolescência, tal como na infância, não é preciso muito para sermos felizes e, por outro lado, Portugal atravessava um período de uma certa prosperidade, pelo que nem os nossos pais estariam especialmente preocupados com nada. Hoje faço um pequeno relato do meu quotidiano e das pequenas coisas que me fizeram feliz. 
    

Habitualmente a parte da manhã ficava reservada a uma ida até à piscina dos Olivais, enquanto a parte da tarde dividia-se entre partidas de cartas, jogos de basquetebol ou, com maior frequência, jogos de futebol num espaço relvado existente na Rua Alferes Barrilaro Ruas, entre os números 20 a 30. 

Na cidade de Lisboa, reunir estas actividades num espaço tão reduzido só era possível nos Olivais, pois mais nenhum "bairro" reunia um complexo desportivo como o das piscinas dos olivais - uma piscina olímpica, uma piscina de saltos, dois campos de futsal, etc. - vários equipamentos desportivos públicos de utilização livre e gratuita - campos de futebol e basquetebol -, espaços verdes suficientemente grandes para neles se realizaram jogos de futebol ou, por último, locais de convívio junto de prédios de habitação onde jogávamos jogos de cartas ou simplesmente nos juntávamos.

À noite, consoante a nossa idade e a época do ano, para além do convívio dos dias mais calmos, aproveitando o ordenamento urbano dos olivais, jogávamos à lata, às escondidas ou aos atacadores.

Como disse foi uma época feliz e, portanto, queria agradecer aos meus amigos de então, bem como aos construtores do bairro dos Olivais que, através de uma equipa interdisciplinar de arquitectos e de especialistas ligados ao desporto, permitiram que passados 30 anos um grupo de jovens tivessem um privilégio ao alcance de muito poucos.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Um pequeno exemplo da ineficiência da Administração Pública: emissão de um certificado de estágio

Eu realizei um Estágio Profissional, cuja instituição de acolhimento foi a Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico de Portalegre, no âmbito do PEPAC (Programa de Estágios Profissionais da Administração Central), tendo este terminado dia 31 de Agosto de 2011. Após esta etapa competia à referida instituição, em colaboração com a DGAP (Direcção Geral da Administração Pública), a emissão de um certificado de estágio que, nas palavras do promotor deste fantástico estágio,  isto é, o Estado português, seria bastante importante para a nossa inserção no mercado de trabalho.

Ora, no último dia do nosso estágio o administrador do IPP esclareceu que a emissão deste certificado iria demorar algum tempo, já que ainda não tinham recibo, por parte da DGAP, quaisquer indicações nesse sentido. Por outro lado, o administrador prontificou-se a emitir um certificado provisório para algum caso específico, caso tal se revelasse necessário. Verdade seja dita que o senhor cumpriu a sua palavra, embora  o local no qual apresentei este certificado provisório não o tenha reconhecido como tal e, portanto, o mesmo não me serviu absolutamente de nada. 

É ainda de referir que este certificado concede a todos os ex-estagiários - desde que tivessem terminado o seu estágio com nota superior a 14 valores -, alguns (poucos) benefícios em concursos públicos, durante o período de dois anos.

No passado dia 1 de Fevereiro, ou seja, meio ano depois de ter terminado o meu estágio, uma funcionária dos recursos humanos do Politécnico de Portalegre contactou-me e passo a citar:

"A fim de que possamos proceder à emissão do certificado do estágio realizado neste Instituto Politécnico, solicita-se que proceda à avaliação do estágio e que a introduza no site da BEP/PEPPAC, no prazo de 5 (cinco) dias úteis.
Mais informamos que o presente prazo, assume natureza imperativa, pelo que a sua não promoção  terá como implícito a não emissão do competente diploma."

É evidente que de imediato preenchi o que fora pedido e fiquei a aguardar. E assim continuo.  Passados 212 dias do final do meu estágio, tendo já passado cerca de 30% do período de tempo em que este me seria benéfico, o Estado Português não conseguiu ainda emitir uma folha A4 comprovando o estágio que realizei na ESTG/IPP. 

Por último, resta-me salientar que no primeiro dia do nosso estágio fomos recebidos por um alto funcionário da Administração Central de Portalegre, que nos disse que íamos compreender a Administração Pública tinha mudado e, inclusivamente, esperava que lhe informássemos, assim que a nossa opinião em relação ao funcionamento desta tivesse alterado. 

De facto mudei de opinião, pois isto funciona muito pior do que eu pensava.

segunda-feira, 5 de março de 2012

Metro de Lisboa na falência técnica, mas porquê?

No início do ano a CP decidiu encerrar a Linha do Leste devido à sua falta de utilização, o que se traduzia em custos incomportáveis para a empresa. Embora seja discutível o encerramento de uma linha que serve uma região com poucas alternativas de mobilidade, na realidade, nas poucas viagens que fiz entre Ponte de Sor e Abrantes, nunca vi mais de dezena e meia de passageiros na única composição que percorria a distância entre as duas cidades, num total de mais de 30 km.

Já em Lisboa, a Linha do Oriente do Metropolitano, mais conhecida por Linha Vermelha, tem cerca de 8 Km. As composições que à hora de ponta fazem este percurso possuem 6 carruagens. Eu todos os dias faço, por duas ocasiões, a viagem Olivais-Saldanha ou Olivais-S. Sebastião, consoante os meus deveres profissionais o exigem. Todos os dias as composições vão praticamente cheias e, por vezes, como ocorreu hoje de manhã, vão sobre-lotadas. As carruagens (ML99) têm uma capacidade para 185 passageiros. Ou seja, hoje comigo seguiam cerca de  1100 passageiros. 

Ora, se no primeiro caso é fácil compreender o avultado prejuízo que a prestação de um serviço de transporte público acarretava para a CP, ficando, por isso, a discussão do seu encerramento ligado apenas a questão de ordem política - valerá a pena ou não manter um serviço altamente deficitário para servir as regiões mais pobres e despovoadas? -, já no segundo custa-me imenso compreender os enormes prejuízos do Metro de Lisboa, isto é, se o Metro se encontra na falência não será certamente por falta de procura.

Num momento em que a gestão de empresas públicas se encontra debaixo de fogo, é fácil apontar o dedo aos administradores do Metro. Não sei será esse o problema, pois não possuo informações suficientes para o saber,  porém, perante estes números, a ideia é bastante sedutora. 

sábado, 3 de março de 2012

Estágios como forma de combater o desemprego: a receita de sempre levará aos resultados do costume


Quanto tiver uma oportunidade gostava de explicar ao Ministro Álvaro Santos Pereira que apostar, mais uma vez, em estágios para combater o desemprego jovem, não é mais que tentar esconder o sol com a peneira. Eu fui estagiário na Administração Pública durante um ano e, como eu, tenho imensos amigos que também já o foram, quer no sector público, quer no sector privado. Invariavelmente o estágio traduz-se no aproveitamento de trabalho qualificado a baixo custo - a remuneração é mais baixa -, onde o estagiário não dispõe dos mesmos direitos dos demais trabalhadores - segurança social, auxílio em situação de doença, baixa médica - e, no final, o estagiário acaba desempregado sem qualquer apoio ficando numa situação financeira extremamente difícil. 

Foi assim nos casos que conheço e não vejo motivo porque agora será diferente. O governo adianta que dará um "incentivo" caso o estagiário seja  contratado, porém, embora desconheça o conteúdo deste incentivo, duvido que este trará quaisquer consequências práticas. Na realidade existem empresas, públicas e privadas, que fazem dos estagiários e de outros planos semelhantes - como o odioso POC -, parte importante da sua força de trabalho, pois recorrem a estes esquemas sucessivamente, acabando por nunca contratar ninguém.

Na realidade todos perdem - a economia, os estagiários e respectivas famílias e, no limite, Portugal - pois os únicos beneficiados são as empresas que recorrem a este esquema e o governo que pode apresentar estatísticas de desemprego mais amigáveis, já que os estagiários não são considerados desempregados, embora também não sejam trabalhadores. Estão, como os bolseiros de investigação científica, num limbo muito difícil de definir.

Enfim, com soluções iguais só poderemos ter resultados iguais, será que é preciso um génio para compreendê-lo?

P.S. - Se alguém se interessar por esta questão na caixa de comentários posso descrever detalhadamente um esquema destes que conheci de perto.

quinta-feira, 1 de março de 2012

A justiça dos vencedores

Hoje numa conversa veio à baila a figura do "Remexido". Para quem não sabe José Joaquim de Sousa Reis, de alcunha "O Remexido", foi um perigoso guerrilheiro algarvio que após a capitulação das forças absolutistas, meteu o Algarve e o Alentejo a "ferro e fogo", derrotando sucessivamente as forças liberais até ao dia em que foi capturado e, posteriormente, fuzilado. A sua história é longa tendo suscitado diversos capítulos e monografias da historiografia portuguesa. Não é esta a história que vou hoje contar, mas sim um dos motivos que levaram este lavrador abastado a revoltar-se contra os poder Liberal instituído em 1834.

Um dos principais motivos foi a "justiça dos vencedores", isto é, o total desrespeito com que, no Algarve, os Liberais violaram a amnistia acordada na Convenção de Évora-Monte. Um dos casos mais célebres foi do Tavirense Tomás Cabreira, governador militar do Algarve durante o reinado de D. Miguel. Capturado e preso em Faro, Cabreira foi assinado por um grupo de Liberais que se infiltraram na cadeia, naturalmente contando com a conivência das autoridades.

Ora a consequência foi a continuação do estado de Guerra Civil no Algarve quase até 1840, quando a paz tinha sido assinada 6 anos antes. Como a história de conflitos bélicos é muitas vezes escrita pelos vencedores quando, na grande maioria das vezes, não há inocentes, achei que devia fazer esta breve referência.