quinta-feira, 6 de setembro de 2012

A exploração de cortiça no Alto Alentejo (1850-1914): uma história de algarvios

Tenho estado a trabalhar num artigo sobre o mercado corticeiro ibérico (1850-1914), em que um dos nossos objetivos é identificar quais as indústrias e regiões que se abasteceram da cortiça norte alentejana. O estudo abrange ainda a Andaluzia, cujos dados foram já publicados por um autor espanhol, e a Extremadura, a cargo do meu co-autor e amigo Francisco Parejo Moruno da Universidad de Extremadura. A mim, naturalmente, cabe-me analisar o Alto Alentejo. 

Neste momento tenho, através da recolha que foi feita por parte da Fundação Robinson de Portalegre, um pouco mais de 550 contratos de arrendamento de cortiça, registados nos Cartórios Notariais daquela cidade. 

Os resultados até agora, não fugindo totalmente às nossas expectativas, têm sido, no entanto, um pouco surpreendentes, já que praticamente as duas únicas regiões que se abasteceram de cortiça portalegrense, foram o Algarve e a própria região de Portalegre - esta quase exclusivamente pela ação de George Robinson.

Destino da cortiça “portalegrense” (1846-1914)
Distrito/País
Réis Transacionados[1]
%
Portalegre
204.753.853
46,55
Algarve
192.848.238
43,84
Lisboa
37.769.566
8,59
Espanha
2.489.115
0,57
Évora
2.041.240
0,46


Entretanto comecei a recolher os mesmos dados para Ponte de Sor. Ainda só tive tempo para analisar 40 contratos, mas destes 36 foram celebrados tendo algarvios como compradores. E são os mesmos que encontrei para Portalegre, naturais de São Brás de Alportel, Santa Bárbara de Nexe ou Loulé. A exploração de cortiça no Alto Alentejo parece ser, até ver, uma história de gentes do Algarve.

(Vista de Silves, em 1934. No centro da imagem a corticeira Villarinho & Sobrinho)


Vejamos como terminará isto tudo.




[1] Os valores encontram-se expressos em preços constantes de 1860-63. Para este cálculo utilizámos o índice de preços de David Justino. JUSTINO, David, Preços e Salários em Portugal (1850-1912), Lisboa, Banco de Portugal, 1990. Para os anos de 1913 e 1914, omissos nesta publicação, extrapolámos o índice tendo em conta a inflação média dos dez anos anteriores.

sábado, 1 de setembro de 2012

Arquivo Municipal de Ponte de Sor | Documentos do mês (Setembro) | "A Fonte da Vila: se bebe na bica… fica em Ponte do Sor"

A presente mostra documental faz parte de uma série apresentada mensalmente, sob o título Documento(s) do mês, que visa divulgar o património documental e histórico do Município de Ponte de Sor.

Este mês, associamo-nos às Jornadas Europeias do Património, uma iniciativa anual do Conselho da Europa e da União Europeia, que envolve cerca de 50 países, com o objetivo de sensibilizar os cidadãos europeus para a importância da salvaguarda do património. Neste sentido, cada país elabora anualmente um programa de atividades a nível nacional, a realizar em Setembro, acessível gratuitamente ao público. A DireçãoGeral do Património Cultural, enquanto coordenador nacional das Jornadas Europeias do Património, propõe para 2012 o tema “O Futuro da Memória”, com o qual pretende promover a aproximação do público ao património cultural, no seu sentido mais amplo, realçando a sua importância enquanto memória e documento da história e do desenvolvimento das sociedades e também o seu papel para a construção do futuro (ver Memorando da DGPC, disponível em http://www.igespar.pt).

O Município de Ponte de Sor participa nestas comemorações organizando, no dia 29 de Setembro, a “Rota do património histórico edificado da antiga vila”, com um percurso pedestre orientado pelo centro histórico de Ponte de Sor e paragem em vários pontos de interesse, entre os quais a Ponte sobre a Ribeira de Sor, a Fonte da Vila, as Capelas de S. Pedro e das Almas, a Igreja Matriz e os Paços do Concelho.

Os documentos do mês são alusivos a um dos mais emblemáticos pontos de interesse patrimoniais de Ponte de Sor, a Fonte da Vila, que data possivelmente do século XVIII. A referência mais antiga que se conhece à Fonte é feita pelo médico Francisco da Fonseca Henriques, na obra Aquilegio Medicinal, publicada em 1726 (ver Doc. 1). Na documentação do Arquivo Municipal, as mais recuadas menções à Fonte datam de 1759 (escritura de aforamento de uma propriedade concelhia situada junto àquela) e 1835 (Auto de Vereação da Câmara impondo vigilância para garantir a qualidade da respetiva água). Uma fotografia publicada na década de 1930 (ver Doc. 3) revela-nos um monumento ligeiramente diferente do atual, tendo a Fonte sofrido algumas intervenções, sobretudo nas armas régias que a ornamentam e que foram mandadas alterar após a Implantação da República (1910), para remoção da coroa, símbolo do poder monárquico destituído (ver Doc. 2).

Documento 1
HENRIQUES, Francisco da Fonseca – Aquilegio medicinal, em que se dá noticia das agoas de Caldas, de fontes, rios, poços, lagoas e cisternas do Reyno de Portugal e dos Algarves que, ou pelas virtudes medicinaes que tem, ou por outra alguma singularidade, são dignas de particular memoria. Lisboa Ocidental: Off. de Musica, 1726. Cap. III («Das fontes frias»), n.º XIV, p. 85. Mais antiga referência à Fonte da Vila, aludindo às suas propriedades medicinais: «Na Villa de Ponte do Soro ha huma fonte que tem conhecida virtude para os achaques de pedra, e areas, como se tem experimentado muytas vezes.»

Documento 2
Fotografia da Fonte da Vila, publicada na década de 1930 em: Concelho de Ponte do Sôr: sua história, seus valores. Separata de Álbum Alentejano. Dir. Pedro Muralha. [S.l.]: Câmara Municipal de Ponte de Sor, [1930s], p. 6. Legenda: «Fonte de antiquíssima construção. Cliché de J. Reis.»



Documento 3
Ponte de Sor, 20 de Abril de 1911 – Em sessão da Câmara Municipal, por proposta do presidente, Dr. Henrique José Caldeira Queirós, «foi deliberado que immediatamente fosse derrubada a corôa que existe no frontespicio da fonte da villa». Não sabemos se esta deliberação chegou a ser posta em prática, mas é certo que as armas régias esculpidas no centro do frontispício da Fonte já sofreram algumas intervenções ao longo dos anos (ver AMPS, Actas das sessões da Camara Municipal de Ponte do Sôr. 1909-1913, fl. 91v).