Otelo Saraiva de Carvalho veio hoje a público defender, embora de forma discreta, a execução de um golpe militar em Portugal, tal como já tinha feito Vasco Lourenço. O antigo "capitão de Abril" e líder operacional das FP-25 referiu que bastariam 800 homens para se fazer uma nova revolução devido ao número reduzido de militares existentes em Portugal.
Na minha opinião os dois militares foram completamente ultrapassados pelo tempo e, tendo em conta o contexto actual, uma revolução militar em Portugal parece-me quase impossível. O mundo mudou desde 1974, a Europa mudou muito e Portugal mudou ainda mais. Três mudanças tornam muito difícil o sucesso de uma eventual revolução militar armada: a própria natureza das Forças Armadas, a autonomia relativa do nosso país e a conjuntura internacional.
1 - Forças Armadas
Em 1974 o peso das Forças Armadas na sociedade portuguesa era incomparavelmente maior do que é hoje em dia. A par com um conflito em três teatros de guerra distintos, Portugal dispunha de quase 300 mil homens em armas, hoje o efectivo dos três ramos das Forças Armadas é ligeiramente inferior a 50 mil militares. Ou seja, o peso numérico dos militares é um sexto do que era há quase 40 anos. Ainda restringindo-me apenas às Forças Armadas é de notar que o Estado Novo era um regime muito mais militarizado sendo, por isso, fácil de encontrar diversos militares a desempenhar os mais altos cargos públicos. O caso mais flagrante era o cargo de Presidente da República ocupado pelo Contra-Almirante Américo Tomás. Alguns dos mais conhecidos oposicionistas eram também militares e tinham precisamente saído de altos cargos do regime, registe-se os casos de Henrique Galvão, Botelho Moniz e de Humberto Delgado.
2 - A autonomia relativa de Portugal
Antes do 25 de Abril, para o bem e para o mal, Portugal era uma nação pluricontinental a caminho dos 30 milhões de habitantes e com algum peso estratégico internacional, por um lado, devido à base das Lajes que era essencial aos EUA como base de apoio no Atlântico Norte e, por outro, pela forte posição regional na África Austral, onde chegámos a ter o apoio da República de África do Sul e da Rodésia de Ian Smith. Actualmente, Portugal é um pequeno país periférico da Europa com 10 milhões de habitantes e com uma autonomia política política que foi reduzida ao longo do tempo pelos diversos tratados de integração europeia.
3 - Conjuntura Internacional
Nos anos 70, o mundo estava divido em dois blocos, o bloco capitalista e o bloco socialista. Em 2011, apesar da China já se afigurar como uma potência rival dos EUA, na Europa não existe um contra-poder que pudesse auxiliar a todos os níveis (diplomático, logístico e militar) uma possível revolução portuguesa - como era o caso da União Soviética.
Assim, mesmo que o pequeno exército português conspirasse e se organizasse de forma a executar um golpe militar não me parece que a comunidade internacional o permitisse. Aposto que em 48 horas a NATO, os Estados Unidos, o Reino Unido ou até Espanha invadiriam o território nacional de forma a "restaurar a liberdade e a democracia" e muito pouco podiam fazer as Forças Armadas portuguesas para o impedir.
Grande post Carlos grande post assino por baixo e creio mesmo que neste momento e um acto impensavel, embora não fosse descabido de todo neste momento ate devido a instabilidade social e ideologica instalada.
ResponderEliminarPois que é desejável é uma coisa se é possível é outra totalmente diferente. Falou-se disso na Grécia, mas os Helénicos têm uma sociedade altamente militarizada devido ao conflito histórico com a Turquia pela soberania do Chipre
ResponderEliminarE se houver um golpe popular?
ResponderEliminarA BBC emitiria um cenário de Guerra Civil,"em 48 horas a NATO, os Estados Unidos, o Reino Unido ou até Espanha invadiriam o território nacional de forma a "restaurar a liberdade e a democracia"".
O que nos faz pensar, que tipo de Liberdade e que tipo de Democracia temos.
Sendo um golpe militar e nao uma invasão militar estrangeira...qualquer pais que interferi-se nisso e invadi-se as nossas fronteiras e espaço aereo estava a ser um inimigo...seria considerado invasao...por isso nao pensem dessa maneira...e digo isso porque sou militar
ResponderEliminarA argumentação deste post não tem em conta as peculiaridades da política portuguesa e longa tradição portuguesa de golpes de estado. Que aconteceram em circunstâncias muito diversas, com forças militares feudais, absolutistas, da monarquia constitucional, republicanas e mesmo da ditadura.
ResponderEliminarVejamos uma cronologia:
1) O golpe militar de D. Afonso Henriques contra sua mãe, que nos deu a independência.
2) 1383 foi um golpe de uma parte da baixa nobreza militar, reunida em torno do Mestre de Aviz, e logo apoiado pelo povo de Lisboa.
3) 1640, semelhante a 1383, mas também com apoio da alta nobreza (também apoiado fortemente pelo povo).
4) A Vilafrancada (golpe militar de D. Miguel), em 1823, que terminou com o liberalismo e reimplantou o absolutismo), que beneficiou de apoio dos sectores conservadores do povo
5) A reacção das forças militares da oposição ao absolutismo (D. Pedro), vindas de parte da elite que havia emigrado para o Brasil, com apoio dos sectores liberais do povo e da burguesia, e que motivou a guerra civil.
6) (1910) A implantação da República, outro golpe militar com largo apoio popular.
7) (20 de Maio de 1926) Pronunciamento militar do general Gomes da Costa, que teve início em Braga e depois rapidamente se estendeu a outros quartéis por todo o país. Teve também apoio dos sectores conservadores e católicos do povo e, como sabemos, implantou o Estado Novo
9) (25 de Abril de 1974) Pronunciamento militar do Movimento dos Capitães, mais tarde MFA, centrado na região de Lisboa, e com pronto e enorme apoio popular, motivado pelo amplo descontentamento dos militares e da população com a Guerra Colonial e o Estado Novo.
10) (25 de Novembro de 1975) Tentativa gorada de golpe de estado da extrema-esquerda militar, que depois recuou perante o seu isolamento -- os comunistas recuaram -- e ante o pronunciamento militar das forças moderadas, comandadas por Ramalho Eanes
Não listei golpes menores, que não originaram eventos de carácter revolucionário, bem como golpes sem sucesso (excepto o 25 de Novembro). Como se vê, as grandes revoluções em Portugal tiveram TODAS como acto fulcral um pronunciamento militar. Quando os militares estão relutantes, é o próprio povo que começa a exigir isso.
Então vamos por partes:
ResponderEliminarMiguel sabes quantos golpes populares com sucesso ocorreram em Portugal no século XX? Nenhum, portanto sou céptico em relação a isso.
Ao senhor militar não compreendo bem o que quer dizer, no entanto, se um país nos invadisse seria considerado inimigo e...?
Quando ao anónimo concordo com uma questão que levanta, de facto a grande maioria das revoluções tiveram um pronunciamento militar, mas recuperando uma das minhas ideias nunca Portugal esteve tão desmilitarizado. Além disso buscar exemplos com 800 anos é, no mínimo, um anacronismo
Li o seu artigo com muita atenção e gostava, caso seja possível, que indicasse quais as suas fontes no que concerne à frase "...nunca Portugal esteve tão desmilitarizado".
ResponderEliminarOlhando para o significado da palavra desmilitarizado podemos observar que o seu significado pode ser:
-Que se desmilitarizou - não, não me parece visto que ainda existem forças armadas.
-Que perdeu o caráter militar - só quem não foi, ou não é, é que poderá pensar isso.
-Privado da guarnição militar - hmmmm, também não.
Peço que não fiquem com a ideia errada, não sou a favor de revoluções ou afins, mas choca-me que se continue a falar de cor do que não se conhece, e que se esqueçam que os militares são profissionais como qualquer outro, e como todos os profissionais não gostam que pessoas que não o são digam que eles não servem para nada, que não sabem desempenhar a sua profissão de forma eficiente, etc.
Acredito, que se o senhor disser aqui qual a sua profissão, a valorosa plateia, irá encontrar certamente um ou vários defeitos.
Espero não ter ofendido ninguém, caso o tenha feito peço desculpa, mais do que normalmente fazem por mim, porque sim, sou militar, uso a minha farda com orgulho, e espero que os meus filhos e a minha família também se orgulhem do que sou.
Sem mais e com os melhores cumprimentos,
Soldado da Pátria, hoje, amanhã e sempre...
A resposta encontra-se logo no primeiro ponto:
ResponderEliminarCompare, em termos relativos, os meios, o número de homens e a capacidade operacional das Forças Armadas portuguesas em 1974 e agora, tem aí a sua resposta. Creio também ser fácil fundamentar com dados quantitativos, é uma questão de se perder tempo à procura.
Quanto à sua condição de militar, não compreendo como poderá ter ficado minimamente incomodado, ninguém colocou em causa o vosso profissionalismo,nem tão-pouco o vosso papel na sociedade portuguesa. Mas diga-me com sinceridade, acha que as Forças Armadas portuguesas, com os meios e efetivos que agora dispõe, conseguiriam defender o território nacional perante uma invasão de uma potência estrangeira como os EUA? Não me parece.
Isto levar-me-ia a uma outra discussão que acho que está algures perdida por este blog que é: Faz sentido, no século XXI dominado por países de dimensão continental, a existência de um pequeno país chamado Portugal? Creio que não. Creio que a Europa para se manter o seu peso no mundo tem que se constituir como um Estado Federado com, entre outras coisas, um exército comum.
Este post que comenta já tem mais de um ano, este espaço re-orientou-se em exclusivo para a História (eis a minha profissão), mas agradeço imenso a sua participação e esteja à vontade para responder.
"conseguiriam defender o território nacional perante uma invasão de uma potência estrangeira como os EUA?" Já antes, no 25 Abril 74, não podia. E como se viu a potência nada fez. Acontece que, o povo juntar-se-ia novamente. Experimentem e verão! O povo está farto disto e se acontecer um golpe, o povo irá juntar-se e todos os argumentos deste post caem por terra. Ah! Não sou militar, mas já o fui, na guerra colonial, na Guiné
ResponderEliminarCaro Anónimo,
ResponderEliminarLamento, mas não me parece que este povo faça seja o que for. A principal característica dos portugueses de agora é serem mansos. Note que perante a corrupção toda que se faz sentir e com o estado de miséria a que chegamos, o povo permanece sereno. A sua geração tinha muitos jovens e muita gente com experiência de combate, a atual é essencialmente grisalha e nunca pegou numa arma. Ninguém vai fazer nada....infelizmente.