sexta-feira, 27 de julho de 2012

Lisboa e os mendigos


Partilho convosco mais um tópico interessante com o qual me deparei no meu trabalho de catalogação de publicações antigas, que integram o fundo biblioteconómico do Arquivo Municipal de Ponte de Sor: a obra "Descripção topographica da nobilissima cidade de Lisboa, e plano para a sua limpeza, e conservação da saude de seus habitantes", de Joaquim José Ventura da Silva, publicada em 1835 e citada num artigo da "Revista Municipal" de Lisboa (ano III, n.º 11 e 12, 1.º e 2.º trimestre 1942, p. 73-76).

Vejam-se alguns dos temas tratados nesta obra, respeitantes a questões de saúde pública: recipientes de lixo, cloacas e pias; limpeza exterior e cores das paredes dos prédios; polícia dos veículos e excessos de velocidade; polícia dos cais; instalação de indústrias; arborização de estradas; classificação e protecção aos mendigos.

Destaco o último aspecto, que me é particularmente caro, remetendo para a preocupação com a extinção da mendicidade, recorrente durante o período da Monarquia Constitucional e ainda no da I República. Joaquim José Ventura da Silva classifica os mendigos em três categorias, nomeadamente:

«1.º dos incuraveis;
»2.º dos que a sua avançada idade lhes não permite ganharem o sustento;
»3.º dos mandriões, que andão pedindo com a capa da pobreza».

Segundo o Autor, os membros das duas primeiras classes mereciam ser assistidos, enquanto para os da terceira preconizava a regeneração, através do trabalho. Em concreto:

- os mendigos incuráveis seriam abrigados no Convento da Graça e os idosos no de S. Vicente;
- «Quanto aos da 3.ª classe (os quaes são muito prejudiciais á sociedade) he necessário, que a policia tome conta delles, e os obrigue a trabalhar; porque como diz S. Paulo: "Quem não quere trabalhar não merece, que o sustentem".» O Autor sugeria a criação de «povoações de mendigos, que possão trabalhar» em zonas despovoadas do Reino, dando-lhes casas para habitarem e courelas para cultivarem e fornecendo-lhes meios de sustento durante os dois primeiros anos; este sistema seria financiado através de uma contribuição directa de toda a população, cobrada ao nível das freguesias e compensada pelo facto de se proibir o acto de pedir esmola pelas portas. Para além disso, os mendigos válidos podiam também ser empregues «nas cadeias, fabricas de tecidos, ou de qualquer outra industria nacional, em que se occupem os braços, e se tire delles utilidade».

Legenda da imagem: Lisboa. Vista panorâmica a partir do jardim de S. Pedro de Alcântara - 1ª metade do séc. XIX. Litografia, Sousa e Barreto, 1844. Disponível em http://purl.pt.

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