No passado dia 16 de Março teve lugar, na Fábrica do Arroz, em Ponte de
Sor, o primeiro de quatro encontros previstos para o ano de 2013, denominados
«Café com Letras». A organização destes eventos está a cargo do núcleo de Ponte
de Sor da Associação Nova Cultura, sendo coordenados por Carlos Manuel Faísca. Nesta
primeira sessão discutiu-se o «negócio corticeiro norte-alentejano», a partir
das intervenções do próprio Carlos Manuel Faísca, doutorando em História
Económica, no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, sob a
orientação do economista Pedro Lains, e de Pedro Mourisco, mestrando em
Empreendedorismo no Instituto Politécnico de Portalegre.
(Carlos Manuel Faísca. Foto de Aníbal Oliveira)
O primeiro comunicante,
após explicar os motivos por detrás da vantagem comparativa no comércio
internacional da cortiça portuguesa, abordou, numa perspetiva comparada, dois
momentos cruciais do negócio corticeiro português: o seu arranque tardio no
contexto europeu (1830-1914); e a ascensão de Portugal a líder mundial do setor
corticeiro (1929-1960). Neste último ponto foram destacadas algumas causas
estruturais para que Espanha, que gozava até então de uma posição hegemónica,
tenha passado a deter um papel secundário, já que Portugal experienciou um
rápido e vigoroso crescimento, graças ao qual conquistou todas as facetas deste
negócio: florestal, industrial e comercial. Para o conseguir, existiu, entre
outros fatores, um forte papel da política económica do Estado. Finalmente, foi
também traçada a evolução regional e local deste setor, durante os últimos
cento e oitenta anos.
(Pedro Mourisco. Foto de Aníbal Oliveira)
Pedro Mourisco começou por
salientar o difícil momento em que vive a economia portuguesa, com especial
impacto nas regiões de interior. Por esse motivo, na sua opinião, cabe às
populações locais trabalharem em conjunto para o desenvolvimento económico das
regiões periféricas portuguesas já que, dificilmente, o governo central o fará.
Em seguida, o segundo comunicante apresentou o seu projeto de living lab. Este consiste na criação e dinamização
de um conceito estratégico para a região de Ponte de Sor, com base no Cluster de cortiça presente em Ponte de
Sor. Após elucidar este último conceito, o jovem economista apresentou diversas
ideias para a dinamização do Cluster
de Ponte de Sor, que incluíram ainda o papel que os principais os atores locais
poderão ter neste tipo de projeto. Para o atingir, Pedro Mourisco recorreu a
uma análise estratégica, que, entre outras ferramentas, utilizou uma Matriz Tows, de forma a criar condições
desenvolvimento para região, bem como para atrair investimento neste Cluster. Por último, foram ainda
levantadas várias questões: se existe uma aposta na formação relacionada com
este Cluster? Se os poderes locais têm
consciência deste Cluster? E qual é o
futuro de Ponte de Sor?
Após as duas apresentações,
seguiu-se, durante aproximadamente uma hora, um intenso debate acerca do
presente e do futuro desta atividade crucial na economia norte-alentejana, com
diversos contributos vindos de uma audiência bastante heterogénea e que contou
com cerca de três dezenas de participantes. As principais conclusões
prenderam-se essencialmente com a necessidade de, por um lado, se apostar na
formação profissional nesta área, tal como, no passado, a Junta Nacional de
Cortiça (1936-1972) o fez; e, por outro, se inverter a política económica para
o setor florestal que, infelizmente, parece querer apostar em espécies onde
Portugal, ao contrário da cultura suberícola, não detém uma vantagem
comparativa no comércio internacional.
(Assistência. Foto de Aníbal Oliveira)
Saliente-se que, em
relação à primeira questão, Fátima Pinheiro, professora da Escola Secundária de
Ponte de Sor, adiantou que aquele estabelecimento de ensino propôs, no ano
transato, a constituição de uma turma de formação profissional vocacionada para
o setor da cortiça, contando, para esse efeito, com o apoio dos encarregados de
educação dos cerca de 20 alunos interessados. Porém, o pedido foi recusado pelo
Ministério da Educação. Conclui-se então que as autoridades centrais
portuguesas não estão a prestar a devida atenção a uma das principais riquezas
nacionais.
Os «Café com Letras» irão
prosseguir, em Junho de 2013, abordando a desertificação do Alentejo, com a
participação de Elisa Silva (ICS/UL), a partir do exemplo das tentativas
de colonização interna da região, durante o Estado Novo; a emigração
científica, com a participação de Tiago Brandão (IHC da FCSH/UNL), em
Setembro de 2013, tendo como base o caso de Joaquim Barradas de Carvalho, com
raízes familiares profundas no concelho de Ponte de Sor; e a desigualdade
social e de rendimento, com a presença novamente de Carlos Manuel Faísca, agora
acompanhado por Bruno Lopes (CIDEHUS da U. de Évora), em Novembro/Dezembro
de 2013.
No final, a organização
fez ainda questão de convidar os presentes a assistirem ao ciclo «Encontros com
a História 2013», promovido por Ana Isabel Silva, já que as duas iniciativas
são complementares. A próxima sessão terá lugar em finais de Abril, no Centro
de Artes e Cultura de Ponte de Sor, com o tema “150 anos da chegada do
caminho-de-ferro a Ponte de Sor”.
Há dezenas de anos a esta parte, dada a forma como são escolhidos os nossos deputados na Assembleia da República, por listas cozinhadas nas sedes centrais
ResponderEliminare não por círculos uninominais com maior ligação aos espaços e às pessoas, que tudo se vem degradando. A escolha, pelas cúpulas partidárias, dos presidentes de Câmara está na mesma linha. Daí haver um total desconhecimento dos interesses do país e do povo, que serve apenas para ir à urna meter o voto do funeral. O não terem aprovado o curso sobre a cortiça é um desrespeito que nem a ignorância dos mandantes serve de perdão. Temos um país à deriva e não se vê timoneiro.
Para já não falar do estereótipo de que ter cortiça é ser rico, esquecendo nomeadamente o forte imposto a que também esta atividade está sujeita, é verdade que os governos nos últimos tempos não têm vindo a Governar mas a governar-se.
ResponderEliminarPor outro lado, muita gente tem sobreiros abandonados mas quer um dinheirão por eles.
De modo que, se não surgir, nesta como noutras áreas, uma campanha dinamizada pelo governo
ou por algum benemérito, de crédito acessível com regulamentação de preços de terras... e de formação de novos produtores/tiradores de cortiça, mas prática, nos campos, nada feito.