segunda-feira, 28 de outubro de 2013

A demolição da Igreja da Encarnação - Um caso de destruição de património histórico

O atual bairro da encarnação deve o seu a uma Igreja - cujo topónimo posteriormente se difundiu por todo aquele lugar -, dedicada a Nossa Senhora da Encarnação, que, infelizmente, foi demolida nos anos 1940. Este templo datava do início do séc. XVIII, sendo, inclusivamente, descrito nas Memórias Paroquiais de Lisboa (1758). 

A Igreja situava-se nas portas (portela) de Lisboa, na convergência entre a Estrada de Sacavém e a Estrada da Circunvalação - de que hoje ainda resta um pequeno troço nas traseiras do Externato São Miguel Arcanjo -, onde também existia uma dependência do Banco Borges & Irmão, um posto fiscal do Ministério das Finanças e uma fábrica de loiça.

Atualmente, para quem conhece o local, toda esta estrutura situar-se-ia algures entre a Escola de Comércio de Lisboa; o viaduto da Avenida Alfredo Bensaúde; o antigo RALIS (Regimento de Artilharia de Lisboa) e a estação de lavagem de automóveis.  

Adquirida pela Câmara Municipal de Lisboa, em Janeiro de 1940, pouco depois a Igreja, que já se encontrava em estado avançado de degradação, foi demolida. Resta, felizmente, uma fotografia no Arquivo Municipal de Lisboa, recuperada na obra "O bairro da Encarnação e as antigas quintas dos Olivais" da autoria Carlos Inácio e Fernando Barreiros. É essa a fotografia que aqui se reproduz

 Igreja da Encarnação (séc. XVIII), em 1939. Fonte: Inácio, Carlos; Barreiro, Fernando - O bairro da Encarnação e as antigas quintas dos Olivais. Lisboa: Edição de autor, 2012.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Arquitetura civil oitocentista: entre Ponte de Sor e Olivais

No passado dia 21 de setembro, os “Encontros com a História” associaram-se à comemoração das Jornadas Europeias do Património e tive oportunidade de apresentar, no CAC de Ponte de Sor, uma pequena comunicação sobre “Arquitetura civil oitocentista no concelho de Ponte de Sor”. Tendo começado por caraterizar o contexto da produção arquitetónica em Portugal ao longo do século XIX, marcado sucessiva e também cumulativamente pelo neoclassicismo, o romantismo e o ecletismo, centrei-me depois nas tendências verificadas na arquitetura do sul do país e, em particular, em alguns imóveis oitocentistas do concelho de Ponte de Sor. Foi possível identificar elementos arquitetónicos neoclássicos, designadamente o traçado retilíneo das fachadas, o desenho de alguns vãos e o recurso a frisos e platibandas (sobretudo com balaustrada), encimadas por acrotérios (em forma de vaso ou esfera) e/ou estátuas. Mas verifica-se igualmente a introdução de componentes decorativos românticos e ecléticos, sobretudo o revestimento azulejar das fachadas e os belos trabalhos em ferro nas guardas e nas bandeiras dos vãos.


O estudo de um determinado assunto, principalmente no que à arte diz respeito, aguça-nos o olhar e desperta-nos para realidades que até então nos tinham passado despercebidas. Depois de umas semanas a estudar a arquitetura oitocentista e a observar atentamente imagens de múltiplos edifícios, incluindo pormenores que se perdem nas vistas gerais das fachadas, dei por mim a ver de outra forma ou a “ver” pela primeira vez diversos imóveis, não só em Ponte de Sor, mas também em Lisboa e, em particular, na zona dos Olivais. Aliás, neste caso, julgo ter despertado o mesmo tipo de “olhar” ao Carlos, que me alertou para as várias semelhanças entre os edifícios do centro histórico daquela freguesia lisboeta e os de Ponte de Sor, analisados na referida comunicação. Afinal (e não resisto a esta pequena provocação), constata-se que na então ainda “Capital do Império”, a par das tendências mais modernas e dos exemplares da “arquitetura de ponta” a nível nacional, se projetava de forma semelhante à da província, no que a arquitetura doméstica erudita diz respeito.

[Nota do editor: Os Olivais foram sede de concelho até 1886 e, portanto, não estavam integrados em Lisboa na época em que alguns destes edifícios foram projetados. Posteriormente, a freguesia continuou a manter um certo carácter pefiférico que só se esbateu totalmente em meados do século XX. Este tipo de arquitectura encontra-se, com facilidade, na Rua de São Bento com cronologias mais recuadas - anos 1850. Isto sem nenhum desprimor para «as nossas terras», Olivais e Ponte de Sor]

Seguem abaixo diversas fotografias de conjunto e de pormenores de imóveis oitocentistas pontessorenses, em particular, os Paços do Concelho e as Casas das Famílias Góis, Branco e Braga; bem como de dois edifícios contemporâneos olivalenses, ambos mandados edificar pelo industrial Francisco Alves Gouveia.

Casa da Família Goes (1877), Ponte de Sor.
Pormenor do gradeamento em ferro da Casa Goes.
Acrotério em forma de vaso, Casa Goes.

Paços do Concelho de Ponte de Sor (1886).
Acrotério de forma esférica, encimando o frontão da fachada lateral dos Paços do Concelho de Ponte de Sor. É idêntico ao que encontramos num dos edifícios da freguesia lisboeta dos Olivais (ver abaixo).
Acrotério em forma de vaso, Paços do Concelho de Ponte de Sor.

Casa da Família Braga (1900), Galveias, Ponte de Sor.
Estátua em cerâmica, figura feminina, Casa Braga.
Estátua em cerâmica, figura masculina, Casa Braga.

Casa mandada construir por António Pais Branco (1899), Ponte de Sor.
Pormenor do revestimento azulejar da fachada da Casa Pais Branco.

Pormenor do gradeamento em ferro da Casa Branco.


Casa mandada construir pelo industrial F. A. Gouveia, Olivais, Lisboa.
Acrotério em forma de vaso ou urna, casa acima.
Acrotério de forma piramidal, casa acima.
Friso com revestimento azulejar, casa acima.

Casa mandada construir pelo industrial F. A. Gouveia (1899), Praça da Viscondessa dos Olivais.
Revestimento azulejar da fachada da casa acima, incluindo o nome do encomendador e a data de construção.
Pormenor da platibanda da casa acima, com estátua e acrotério.

Estátua em barro (?), figura feminina, casa acima.
Acrotério de forma esférica, casa acima. É idêntico ao que encontramos no edifício dos Paços do Concelho de Ponte de Sor (ver acima).

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Um mercado que não reage? A transformação industrial de cortiça em Portugal (1870-1930)

A exportação de cortiça em Portugal, ao contrário do que se poderia pensar do maior produtor mundial de cortiça, privilegiava a venda da matéria-prima em bruto ou semitransformada, com pouco ou nenhum valor acrescentado, em detrimento da exportação de cortiça transformada, de elevado valor acrescentado. Como exemplo, posso adiantar que, entre 1867 e 1933, um quilograma de cortiça transformada foi vendido por um valor entre 2 a 5 vezes superior ao da cortiça em bruto ou semitransformada.

Gráfico 1 - Rácio do valor de cortiça transformada/cortiça semitransformada ou em bruto 


Ainda assim, a percentagem de cortiça transformada pela indústria nacional cresceu, neste período, mas de forma muito lenta. Aliás, como se pode verificar no gráfico anterior, o preço da cortiça transforma mostrou uma tendência de crescimento, não obstantes diversas oscilações, superior à matéria-prima semitransformada ou em bruto.


Na realidade, a indústria corticeira portuguesa parece ter reagido muito lentamente à subida de preço da cortiça transformada, já que a correlação entre o preço desta e percentagem de cortiça transformada no total das exportações portuguesas é de 0,15. Ou seja, existe uma fraca ligação entre a valorização da cortiça e a sua transformação industrial em terras lusas.

Fica a pergunta: porque é que os agentes económicos não reagiram ao mercado?

domingo, 6 de outubro de 2013

Capela dos Alpoim na Igreja Paroquial de Santa Maria dos Olivais

Na atual freguesia dos Olivais dos quatro edifícios utilizados como Igreja, apenas uma, a Igreja Paroquial de Santa Maria dos Olivais, foi edificada anteriormente ao século XX. Isto porque uma outra, situada junto às portas (portela) de Lisboa foi demolida aquando da construção do Aeroporto. Mas isso será um assunto que abordarei noutra ocasião.

A Igreja Paroquial de Santa Maria dos Olivais, como creio ser do conhecimento da grande maioria dos Olivalenses, foi fundada nos finais do séc. XIV. Contudo, o edifício atual é fruto de uma reconstrução setecentista, com bastantes alterações sofridas após o terramoto de 1755.

Sendo relativamente simples, com uma única nave, possui, no entanto, duas capelas. A do lado esquerdo, com a evocação de Nossa Senhora de Lourdes, ostenta o brasão da família Alpoim, bem como uma sepultura da mesma família.

Brasão da família Alpoim no arco de uma capela lateral da Igreja Paroquial de Santa Maria dos Olivais

Era bastante comum, no Antigo Regime, que determinadas instituições (confrarias, algumas misericórdias de menores posses, etc.), assim como as famílias nobres, erguessem capelas privadas. Nestas poder-se-ia prestar culto aos padroeiros da irmandade, aos irmãos ou aos defuntos da família, consoante a capela fosse «institucional» ou «familiar». Era também comum a «aquisição» de missas - que, por um montante mais elevado, podiam ser cantadas - por alma dos que faleceram.

A Igreja Paroquial de Santa Maria dos Olivais não constitui exceção e aqui ficam duas imagens, convidando todos os Olivalenses a visitarem este imóvel classificado como de Interesse Público.

Sepultura ostentando o brasão dos Alpoim. Igreja Paroquial de Santa Maria dos Olivais.