No mês de abril de 2013 assinalamos a passagem de século e meio sobre a chegada do caminho-de-ferro a Ponte de Sor, em particular, a inauguração da secção da Linha do Leste entre Abrantes e Crato, que ocorreu no dia 4 de maio de 1863 (ver Doc. 3). Em Portugal, os trabalhos de assentamento do caminho-de-ferro começaram dez anos antes, em 1853, tendo a obra sido adjudicada pelo Estado à Companhia Central Peninsular de Caminhos de Ferro. Um dos principais objetivos deste empreendimento era ligar Lisboa à fronteira espanhola, ou seja, estabelecer comunicações rápidas entre Portugal e o estrangeiro. O primeiro troço de linha férrea, entre Lisboa e o Carregado, foi solenemente inaugurado em 1856. Os atrasos registados na construção deveram-se à instabilidade dos construtores, tendo-se rescindido o contrato com a Companhia Peninsular em 1857; em 1859, assinou-se um outro com D. José Salamanca e aprovaram-se os estatutos da Companhia Real dos Caminhos-de-ferro Portugueses; os trabalhos tomaram então carácter definitivo e acelerado. Em 24 de Novembro de 1863 ficou concluída a Linha do Leste (extensão de 272 quilómetros), considerada, a par da Linha do Norte (ligação Lisboa-Porto, terminada em 1864), o marco mais importante do lançamento da rede ferroviária nacional.
Em Ponte de Sor, os trabalhos da linha férrea começaram no verão de 1860, como testemunha a ata de uma sessão camarária de Junho desse ano (ver Doc. 1). As obras ficaram marcadas, entre outros aspetos, pela insalubridade da região, sobretudo no verão, sendo os operários vítimas do sezonismo, e por um acidente ocorrido em dezembro de 1861, com a queda de uma ponte sobre a Ribeira de Sor, junto à povoação original de Torre das Vargens (hoje chamada Torre Velha), arrastando consigo um comboio experimental, carregado de material e trabalhadores; quase todos faleceram.
Segundo Primo Pedro da Conceição, naquele princípio de maio de 1863, «o comboio inaugural foi recebido, através do percurso pelos povos da região, com estrepitosas manifestações de alegria.» Saía às 7h00 da manhã de Santa Apolónia e chegava a Ponte do Sor às 2h24 da tarde (ver Doc. 2). Sugerindo o forte impacto do caminho-de-ferro no desenvolvimento local, o mesmo autor afirma que «a estação de Ponte do Sor […] passou imediatamente a servir, tanto em passageiros como em mercadorias, esta vasta região que compreende as vilas de Mora, Cabeção, Montargil, Pavia, Avis e Galveias, que lhe deram um movimento extraordinário.»
Documento 1
1860 junho 24, Ponte de Sor – Ata de sessão da Câmara Municipal de Ponte de Sor, testemunhando o início dos trabalhos da linha férrea nesta zona no verão de 1860. O presidente do Município propunha que se solicitasse às autoridades competentes uma força de quinze a vinte soldados de Cavalaria, para fazer face à grande concorrência de operários que aqueles trabalhos trariam, «com o que pode seguir-se de graves dezastres»; concordando, a Câmara encarregou-o de requerer o que julgasse necessário «em beneficio da boa policcia». AHMPS, Livro de actas das sessões da Câmara 1851-1860, fl. 187.
Documento 2
Portaria de 12 Março 1863 – O rei D. Luís mandava participar ao fiscal da construção das linhas férreas de Leste e Norte que, aproximando-se a abertura à circulação pública da secção da Linha do Leste entre Abrantes e Crato, aprovava o horário do serviço provisório da exploração dessa Linha, entre Lisboa e esta última localidade. Publicado em anexo, o horário inclui as horas de chegada e de partida de cada estação e os preços dos bilhetes. A viagem de Lisboa a Ponte de Sor durava cerca de 7 horas e os bilhetes custavam1.640 réis em 3.ª classe, 2.300 em 2.ª e 2.960 réis em 1.ª. Fonte: Diário de Lisboa: folha official do governo portuguez. N.º 62, 19 Março 1863, p. 796.
Documento 3
1863 abril 29, Ponte de Sor – Ofício dirigido pelo Chefe da Estação de Caminhos-de-Ferro de Ponte de Sor, Domingos Boaventura de Almeida, ao Administrador do Concelho. Comunicava que o início do serviço de exploração da Secção da Via Férrea entre Abrantes e Crato se achava anunciado para o dia 4 de Maio e remetia 6 exemplares da tabela do mesmo serviço para que o Administrador, querendo, os mandasse afixar nos lugares mais públicos do concelho. O destinatário averbou no ofício que se mandaram afixar e se distribuíram os exemplares referidos. AHMPS, Pasta de correspondência recebida «1863 Caminhos de ferro».
Nota: na imagem em cima, pormenor de Mappa dos caminhos de ferro de Portugal e Hespanha. Escala 1:2000000. [Lisboa]: Lith. Matta, 1898. Disponível em http://purl.pt/1930/2/index.html.